Carol Medeiros e Maria Luisa Barros
O êxodo de mestres preocupa o Ministério da Educação (MEC), que estuda medidas para cobrir déficit de 710 mil docentes no Brasil. De acordo com relatório do órgão, o País vive ameaça de “Apagão do Ensino Médio”, como O DIA vem mostrando desde domingo.
As doenças psiquiátricas são a principal causa de afastamento dos mestres — mais de 50%, de acordo com o Sindicato Estadual de Profissionais da Educação (Sepe). Recentemente, doença conhecida como Síndrome de Burnout, ou Síndrome do Desgaste Profissional, tem acometido milhares deles.
“Existe uma despreocupação com a saúde do professor. A doença acomete pessoas que são muito dedicadas ao trabalho e não têm boas condições para exercê-lo. No caso dos mestres, eles se sentem acuados diante dos baixos salários, jornada excessiva, prédios malconservados, falta de equipamentos e violência”, atesta a psicóloga Gisele Levy.
Pesquisadora da Uerj (Gisel Levy), ela verificou que 70% dos mestres de cinco escolas municipais de Niterói sofrem da síndrome, que causa grande exaustão física e emocional.
Em setembro, a síndrome fez mais uma vítima. Apaixonada pela profissão, B., 51 anos, desenvolveu a doença ao longo de seis meses de convívio com alunos de uma escola municipal da Zona Sul do Rio. Submetida à rotina sufocante de ameaças, xingamentos e humilhações, a professora de Português não suportou a pressão e entrou em licença médica. Hoje, vive à base de antidepressivos e não consegue se aproximar de uma escola.
“Quando entrei para o município, achei que tinha chegado ao paraíso, mas descobri que era o inferno. Professor é um lixo para eles”, lamenta. Seu sofrimento começava no domingo à noite. “Era outra pessoa. Vivia tensa, pensando no que ia enfrentar no dia seguinte”, relembra.
Há três meses, M., 30 anos, também deixou a escola. Professora de Geografia de uma escola estadual na Baixada, foi agredida por uma de suas alunas quando esperava o ônibus de volta para casa. Durante a aula, a estudante se revoltou ao receber sua média. Gritou e xingou M., que, acuada, concordou em rever a nota. “Achei que estava resolvido. Fui pegar ônibus e de repente ela apareceu. Agarrou meu cabelo e começou a me dar socos no rosto, abrindo minha testa. Saía muito sangue, fiquei em choque. Outros alunos me socorreram”, conta. No início do mês, M. voltou à sala de aula, depois de conseguir transferência para outra escola.
NÓDULOS NAS CORDAS VOCAIS AFETAM MESTRA
Problemas na voz e articulações são, atrás de males psiquiátricos, as grandes causas de licença médica. Eliana Cunha, 42, é mais uma vítima de doença comum entre os docentes: fendas nas cordas vocais. Sem tratamento, elas se transformaram em nódulos que podem progredir para câncer de laringe. Impossibilitada de dar aula, foi readaptada como coordenadora pedagógica após 13 anos dando 42 tempos de Português por semana.“O salário baixo nos obriga a ir além dos limites. O médico disse que, se não parar, serei aposentada à força”, conta.
AMEAÇA E PROBLEMAS DE SAÚDE
Aos 40 anos, R. tem duas faculdades e cinco anos de magistério. Mas nem toda a sua experiência a preparou para enfrentar a ameaça de um aluno. Professora de Ensino Religioso, teve que fugir da escola onde dava aula, na Baixada Fluminense. Seu crime foi ter chamado a atenção do jovem, que arrastava a cadeira fazendo barulho. “Ele veio para cima de mim gritando e chegou a me ameaçar de morte. Ele já era maior de idade, a gente nunca sabe com quem está lidando. Fiquei transtornada e me senti completamente vulnerável. Tive crise nervosa que provocou queda de cabelos e precisei de tratamento. Acabei descobrindo que vários professores já tinham sofrido com xingamentos e agressões”, conta.
ESTRESSE, PRESSÃO ALTA E PAVOR
Cercada por pichações, B. tentava em vão atrair a atenção dos 50 alunos. “Era o caos. Horrível. Eles se xingavam, casais se agarravam dentro de sala. Imitavam animais e gritavam sem parar uns com os outros. Quando virava para o quadro me atiravam bolas de papel com cola. Um aluno me contou que incendiou até a morte outro menino preso a um pneu. Vivia com pressão alta até que um dia entrei em desespero e quebrei a minha cozinha”, lembra.
© Copyright Editora O DIA S.A. - Para reprodução deste conteúdo, contate a Agência O DIA.
O Dia Online Agência O Dia O Dia Comercial O Dia Classificados
O Dia Assinatura FM O Dia Portal Mais Promoções Instituto Ary Carvalho